Justiça de Dubai solta albanês que comprava cocaína do Brasil

Eduardo Mauricio O Globo Interpol prende cidadão albanês que enviava cocaína do Brasil para Europa

Decisão ocorreu depois que Ministério da Justiça do Brasil não cumpriu prazo para envio dos documentos do processo de extradição

A Justiça de Dubai, nos Emirados Árabes, mandou soltar o cidadão albanês Armando Pacani, réu no Brasil por liderar uma organização criminosa brasileira que enviava cocaína à Europa. Pacani, que estava na Difusão Vermelha da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), havia sido preso em julho. Em novembro, entretanto, foi liberado até que o processo de extradição seja devidamente enviado pelo Brasil, de acordo com os parâmetros solicitados, como a tradução dos documentos para o árabe, carimbos e assinaturas. 

No primeiro dia de agosto, a Autoridade Central dos Emirados Árabes Unidos (EAU) devolveu o pedido de extradição de Armando Pacani ao Brasil sob o argumento de que o processo deveria estar traduzido para o árabe, além de carimbado e assinado por autoridades do Ministério da Justiça. O prazo para retorno era de 30 dias. Em 20 de novembro, o Ministério das Relações Exteriores dos Emirados Árabes voltou a cobrar o Brasil. Em 3 de dezembro, o Ministério da Justiça encaminhou a documentação solicitada. O GLOBO teve acesso ao conteúdo de toda essa tratativa. 

Pacani foi liberado sob fiança “até que o pedido de extradição seja recebido por meio de canais diplomáticos” do Brasil, diz um trecho do documento do Ministério do Interior dos Emirados Árabes. 

Segundo denúncia do Ministério Público Federal, Pacani era o destinatário de boa parte das 17 toneladas de cocaína pura que um grupo criminoso com base em portos do Sul do país enviou à Europa no período de dois anos, mercadoria estimada em R$ 3,8 bilhões. Conhecido pelos codinomes Albanês, Forbes e Globe, Pacani é acusado dos crimes de tráfico de drogas, lavagem de dinheiro e organização criminosa. 

De acordo com a investigação, o grupo mandou pelo menos 13 remessas de cocaína vinda dos países andinos, a partir dos portos de Rio Grande, no Rio Grande do Sul, e Itajaí, em Santa Catarina. A droga era escondida em contêineres com carga lícita, sem o conhecimento dos donos das mercadorias, ou partia em embarcações pesqueiras. 

Uma das remessas foi apreendida pela Marinha Francesa perto de Serra Leoa em novembro de 2022. O barco pesqueiro levava 4,6 toneladas de cocaína em cerca de cem malas — o equivalente a quase R$ 800 milhões. A operação foi um trabalho conjunto da PF, da Drug Enforcement Administration (DEA), da Agência da União Europeia para a Cooperação Policial (Europol) e de autoridades francesas. 

Integrante da máfia albanesa, Pacani é apontado pelo MPF como responsável por acompanhar “a logística do tráfico internacional de drogas, desde o fornecimento nos países andinos, passando pelo armazenamento e trabalhos portuários, transporte marítimo, até o recebimento na Europa”. Ele estava foragido desde a deflagração pela Polícia Federal da Operação Hinterland, em março do ano passado, quando foi preso em julho. 

Para dissimular as grandes cifras movimentadas pelo tráfico internacional, a organização criminosa do Sul usou diversas modalidades de ocultação de capitais. Segundo o MPF, o grupo contava com uma espécie de banco paralelo, sistemas financeiros à margem para enviar dinheiro ao exterior para pagamento de fornecedores, e com redes de pessoas jurídicas de fachada para fazer circular o fluxo financeiro. 

Uma megaoperação policial contra o tráfico internacional, coordenada pelas polícias de Bélgica, França e Holanda e deflagrada em março de 2021, acabou por definir também o futuro dos narcoempreendedores do Sul do Brasil. A operação derrubou a plataforma de comunicação criptografada Sky ECC, amplamente usada para planejar o comércio global de entorpecentes, e forneceu aos governos de dezenas de países trocas de mensagens valiosas entre criminosos. 

Segundo a PF, a Hinterland foi a primeira operação do Brasil a se debruçar sobre mensagens do SKY ECC para chegar aos autores de crimes. Foi ao acessar as mensagens do Sky ECC que os investigadores chegaram a Pacani, apontado como principal comprador da droga da organização criminosa na Europa. Registros da imigração apontam que Pacani entrou no Brasil em janeiro de 2019 e saiu em agosto de 2020, em voo da Emirates de São Paulo para Dubai. 

Em nota, o advogado Eduardo Maurício, que faz a defesa de Pacani, afirma que o acusado é inocente. “Isso está cada vez mais claro em todas as oitivas de testemunhas que já foram celebradas no âmbito da Operação Hinterland. A liberdade concedida a Pacani ocorreu no âmbito do processo de extradição em Dubai, e se trata do cumprimento da lei. Continuaremos a pleitear a sua exclusão da Interpol e, sobretudo, a nulidade da prova baseada nas conversas telefônicas criptografadas no SKY ECC, que afrontam a cadeia de custódia, preservação da prova digital e a lei de interceptação telefônica”. 

O Ministério da Justiça afirma que, “a fim de preservar a segurança de potenciais operações em andamento, a Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça e Segurança Pública não se manifesta em relação a casos específicos, recebidos ou não, os quais correm em sigilo, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados”. O MJ informa ainda que “os prazos definidos em lei, acordos e tratados relacionados a processos de extradição são rigorosamente respeitados”.

Fonte: https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2024/12/17/justica-de-dubai-solta-albanes-que-comprava-cocaina-do-brasil.ghtml

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