A investigação transfronteiriça sobre o Matrix destaca o papel essencial da cooperação internacional no combate ao crime organizado. A rápida troca de informações entre as forças policiais de diferentes países possibilitou ações mais eficazes
Recentemente, a Europol conseguiu descriptografar o Matrix, um dos aplicativos mais recentes utilizados por supostos membros do crime organizado. Com servidores em mais de 40 países, especialmente na França e na Alemanha, a operação resultou em diversas prisões preventivas e mandados de busca e apreensão na Espanha e em outros países da União Europeia.
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Em uma análise técnica, a infraestrutura desta plataforma era mais sofisticada do que de serviços anteriores, como Sky-ECC e EncroChat. O acesso ao Matrix dependia de convites enviados por usuários já cadastrados, estabelecendo um filtro rigoroso que aumentava a confiança entre os membros, uma vez que o ingresso na plataforma ocorria exclusivamente por indicação de contatos pessoais.
A operação conjunta foi conduzida por autoridades holandesas e francesas, com o apoio de uma equipe de investigação criada pela Eurojust. Por meio de tecnologias avançadas, foi possível interceptar e descriptografar mais de 2,3 milhões de mensagens ao longo de três meses. Essas mensagens estariam relacionadas a crimes graves, incluindo tráfico internacional de drogas, tráfico de armas, lavagem de dinheiro e outros delitos.
Em 3 de dezembro, as autoridades tomaram medidas para desativar os servidores da plataforma e prender supostos criminosos em quatro países: França, Espanha, Países Baixos e Lituânia. A “invasão” policial foi comunicada aos usuários por meio da página inicial do Matrix. A partir de então, as autoridades policiais passaram a acessar mensagens mediante solicitações legais ao Poder Judiciário.
A investigação transfronteiriça sobre o Matrix destaca o papel essencial da cooperação internacional no combate ao crime organizado. A rápida troca de informações entre as forças policiais de diferentes países possibilitou ações mais eficazes. Em junho de 2024, foi criada uma Força-Tarefa Operacional (OTF) na Europol, composta por membros dos Países Baixos, França, Lituânia, Itália e Espanha, responsável por monitorar as atividades criminosas no Matrix.
A Europol continuará a prestar assistência em investigações decorrentes das informações obtidas durante a operação, que também resultou na apreensão de valores milionários em dinheiro, criptomoedas, bens móveis e imóveis, dispositivos eletrônicos e outros itens.
O encerramento de plataformas como Sky-ECC, EncroChat, Exclu e Ghost fragmentou ainda mais o cenário das comunicações criptografadas. Criminosos têm migrado para ferramentas personalizadas ou menos conhecidas, que oferecem diferentes graus de segurança e anonimato. Apesar dos desafios impostos à aplicação da lei, o desmantelamento de plataformas estabelecidas demonstra que as autoridades estão atentas às inovações tecnológicas utilizadas no crime.
Importante ressaltar que o uso de mensagens interceptadas na plataforma Matrix traz à tona questões legais que merecem análise criteriosa, especialmente em processos penais. Pontos fundamentais que podem levar à nulidade das provas incluem, por exemplo, a decisão judicial prévia, pois é imprescindível verificar se a interceptação foi autorizada por decisão judicial válida. Caso contrário, haveria violação de direitos fundamentais, como a privacidade, podendo ser aplicada a teoria do fruto da árvore envenenada, que anula provas obtidas de forma ilícita.
Além disso, é necessário avaliar a cadeia de custódia, pois deve-se garantir que as mensagens foram preservadas integralmente, sem manipulação ou adulteração, por meio de procedimentos técnicos, como o uso de hashes digitais, em conformidade com as legislações locais. E isso implica também a identificação dos autores. Isso porque atribuir mensagens a indivíduos específicos requer provas robustas, como geolocalização ou perícias de reconhecimento de voz, para evitar erros na identificação dos responsáveis.
E para garantir que as provas sigam o legítimo caminho processual é necessária a cooperação internacional para o compartilhamento de provas entre países. que deve seguir os canais formais e as leis aplicáveis para evitar questionamentos sobre a legalidade das ações. E essas provas devem ser integras, com a realização de verificações técnicas independentes para confirmar que as provas correspondem aos dados originais apreendidos e que sua integridade foi mantida. E também as condições técnicas dos dispositivos interceptados devem ser verificadas para garantir que estavam sob o controle dos suspeitos identificados.
Portanto, a definição sobre a validade das provas obtidas no Matrix exige um posicionamento célere e técnico do Tribunal Europeu, garantindo uniformidade nas decisões e evitando tumultos processuais. É essencial equilibrar o combate ao crime organizado com a proteção de garantias fundamentais, como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório. Assim, busca-se assegurar que o Judiciário atue de forma justa e alinhada à busca pela verdade real dos fatos, sem comprometer os direitos dos acusados.